Atire
a primeira pedra quem jamais agiu como um mentecapto, como O Grande Mentecapto. A incomensurável obra de Fernando Sabino, que
quase fora lançada ao cisco, ocupa espaço relevante na Literatura Brasileira.
No ano de 1946, aos 23 anos, Fernando Sabino iniciou o que se volveria em uma
de suas maiores obras, mas logo a largou para dedicar-se a outras histórias,
todavia, por iniciativa de sua esposa, tornou a escrevê-la e publicou-a 33 anos
após, tal obra rendeu-lhe o prêmio Jabuti e chegou a ser adaptada ao teatro e
ao cinema.
Sabino
foi atleta, jornalista, escritor; escreveu contos, crônicas e romances; cursou
Direito, correspondeu-se com diversos autores brasileiros; recebeu diferentes
honrarias da literatura nacional, tal como o prêmio Machado de Assis da
Academia Brasileira de Letras, no ano de 1999. Uma eterna criança, Sabino não poderia
ter nascido em outro dia que não o 12 de outubro, no ano de 1923, falecendo aos
11 de outubro de 2004, à véspera dos 81 anos. Em sua lápide consta, a seu
pedido, a frase: “Aqui jaz Fernando Sabino, que nasceu homem e morreu menino”.
Foi um grande homem menino, outra de suas valiosas obras chama-se O Menino no
Espelho e retrata bem a temática da infância.
O
Grande Mentecapto é uma espécie de Don Quijote da Língua Portuguesa. Geraldo
Boaventura - que galgará diversos apelidos, graças as suas desventuras, no
entanto, o mais popular será o Viramundo, Geraldo Viramundo – é o protagonista
desse romance que muito se aproxima das novelas picaresca e apresenta ao leitor
uma narrativa trágico-cômica. Assim como a personagem de Miguel de Cervantes,
Viramundo é um sonhador, ingênuo e aventureiro que se depara com a hipocrisia e
maldade em suas andanças por algumas cidades mineiras. Para além de um
andarilho, Viramundo caminha em busca de transformar a sociedade. Sua loucura e
seus vastos conhecimentos adquiridos no seminário e no serviço militar são
destaque na apresentação desse herói sofredor.
Miguel
de Cervantes e Fernando Sabino são comparados nas análises dos críticos, mas o
autor do Mentecapto, já destaca em sua obra outros literatos importantes;
Alphonsus Guimarães, por exemplo, é citado no início do romance, esse poeta
mineiro que se destacou na Escola Simbolista Brasileira é honrado por Sabino, a
semelhança de outros modernistas.
A
narrativa, embora detalhista, não é tediosa.
Viramundo é apresentado ainda em sua fase infantil, quando residia em
Rio Acima. Narra-se a façanha que viveu envolvendo o trem que cortava a cidade,
mas não parava, contudo, ele movimentou toda a meninada da região que
contemplou o ainda moleque parar o trem; tal façanha culminaria num terrível
caso que transformaria a vida de Viramundo para sempre. De Rio Acima segue para
o seminário, em Mariana, no que é expulso após o alvoroço na cidade envolvendo
a Dona Pietrolina, mas conhecida por Peidolina. Após suas desventuras em
Mariana, segue para Ouro Preto, onde se envolve com estudantes e se apaixona -
tal qual Don Quijote, por Dulcineia e Dirceu, por Marília – pela filha do
governador Clarimundo Ladisbão, também nomeada Marília. A história segue
contando sua passagem por Barbacena, onde se candidata a prefeito e participa
de um cômico debate eleitoral. Viramundo continua suas andanças por outras
cidades de Minas Gerais até se encontrar com um final estarrecedor.
Destaque
para a maneira que o narrador apresenta-se: um pesquisador em busca de
informações sobre o herói Geraldo, como se ele realmente tivesse existido. Não
chega a ser um narrador-personagem, mas há um envolvimento marcante,
dialogando, por vezes, com o leitor, deixando a leitura agradável e propícia à
criação de imagens de cenário e de personagens; ademais, a história tece
críticas à corrupção e às injustiças, revela as crenças da população brasileira
e de fato, como muitos críticos apontam: esse romance é uma analogia ao povo
brasileiro, as suas múltiplas características, todavia, ainda faz-se afirmar a
relação de Viramundo com Cristo, em sua Via Crucis. Sem dúvida, um dos melhores
livros da Literatura Brasileira.
A
indicação de leitura de hoje não poderia deixar de ser O Grande Metecapto, de
Fernanado Sabino. Deleitem-se! Deus vos abençoe.
Amanda Rocha é professora e escritora
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