O filósofo Olavo de Carvalho, considerado o “guru” da nova
direita brasileira, entrou em rota de colisão com peças-chave do governo de
Jair Bolsonaro (PSL). Nos últimos dias, um número elevado de postagens críticas
de Olavo nas redes sociais e a demissão de seguidores do filósofo na Esplanada
se sucederam, o que despertou o debate sobre a real influência que, hoje,
Carvalho tem sobre o governo federal.
Olavo atacou ministros – sem citar nomes, disse que há
“traidores filhos da puta dignos de serem jogados na privada” – e o núcleo
militar da gestão Bolsonaro. Disse que os generais “caem de joelhos” para os
veículos de comunicação. Contrariado, Olavo recomendou que seus alunos
deixassem o governo e voltassem “à vida de estudos”.
A crítica aos militares tem como principal alvo o
vice-presidente, o general Hamilton Mourão. Olavo já havia contestado a atuação
do vice em outras ocasiões e, nesta semana, escreveu em seu perfil no Facebook:
“maior erro da minha vida de eleitor foi apoiar o general Mourão. Não cessarei
de pedir desculpas por essa burrada”. Em resposta, Mourão mandou “beijinhos” a
Olavo.
Educação vira foco de conflito
O principal foco das polêmicas recentes envolvendo Olavo de
Carvalho é o Ministério da Educação. A pasta tem como titular Ricardo Vélez
Rodriguez, que foi indicado pelo filósofo para o cargo. Nos escalões
inferiores, antigos alunos de Olavo passaram também a integrar o ministério,
como Silvio Grimaldo, secretário-executivo adjunto da pasta, e Murilo Resende
Ferreira, integrante da Secretaria de Educação Superior.
Foram justamente esses nomes do segundo escalão que
“protagonizaram” as controvérsias dos últimos dias. Grimaldo e Resende
figuraram em uma lista de “demissionáveis”. Outros como Ayrton Pereira Rippel,
Rodrigo Almeida Morais e Flávio Pereira de Souza foram efetivamente desligados.
Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, o motivo das
alterações no Ministério foi a polêmica carta enviada pelo ministro Vélez
Rodríguez no fim de fevereiro a escolas, em que pedia a execução do hino
nacional, a filmagem do ato e a citação do slogan “Brasil acima de tudo, Deus
acima de todos”, que embalou a campanha de Bolsonaro. Mesmo com o ministro
tendo, depois, admitido que a requisição havia sido um erro, o impacto político
do ato já havia tomado grandes proporções.
A onda de demissões e especulações foi classificada por
Silvio Grimaldo como um “expurgo”. “É a maior traição dentro do governo
Bolsonaro que se viu até agora. Nem as trairagens do Mourão ou do Bibiano [sic]
chegaram a esse nível”, escreveu, em seu perfil no Facebook. Em seguida a essa
postagem, ele anunciou seu pedido de exoneração.
Considerado um dos possíveis demitidos do Ministério, Murilo
Resende falou à Gazeta do Povo que permanece no cargo. “O que houve, por
enquanto, é especulação. Não foi me passada mudança nenhuma”, disse. Resende
foi aluno de Olavo de Carvalho, a quem define como “um grande homem e um grande
filósofo”.
Também aluno de Olavo, o deputado federal Filipe Barros
(PSL-PR) pediu ao ministro Vélez que reconsidere as mudanças. “Tirar ou mudar
de função os alunos do professor Olavo foi um erro estratégico. Espero que o
ministro reveja sua posição o quanto antes. A gente sabe que o Olavo
desempenhou e desempenha ainda hoje um papel fundamental nesse surgimento da
nova política. Ele teve também um papel preponderante na eleição de Bolsonaro”,
destacou o parlamentar.
Já a também deputada federal Carla Zambelli (PSL-PR) tem uma
avaliação mais crítica da postura de Olavo de Carvalho. “Ou ele se adequa e
entende o que é ser governo, ou é melhor que fique muito longe”, atacou.
Segundo a parlamentar, Olavo tem uma trajetória oposicionista – “era comunista
na época do regime militar, migrou para a direita quando todos estavam na
esquerda” – e, por isso, “não sabe ser situação, só sabe bater”.
Um discípulo no Itamaraty
O ministro da Educação foi um dos dois indicados por Olavo
de Carvalho a Jair Bolsonaro. O outro foi o titular das Relações Exteriores,
Ernesto Araújo. Também aluno do filósofo, o chanceler diz se identificar com
algumas visões de Olavo, como o combate ao “globalismo” e a defesa dos “valores
ocidentais”.
O desempenho de Araújo é um dos mais contestados neste
início de governo. A adesão a bandeiras defendidas pelo governo dos EUA, como a
mudança da embaixada em Israel para Jerusalém, tem contrariado outros segmentos
do governo e sido apontada como fator que prejudica as exportações brasileiras.
“Se o Olavo defende que os alunos dele deixem o governo,
acho que o Ernesto deveria ser o primeiro a sair”, criticou Zambelli. Ela
mencionou críticas feitas pelo ministro ao governo chinês: “parece que eles não
percebem que, hoje, o Brasil depende muito mais da China do que a China do
Brasil”.
A influência dos valores de Olavo sobre o ministro das
Relações Exteriores se manifestou também no episódio Paulo Roberto de Almeida,
o embaixador dispensado do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais
(Ipri) após postar em seu blog pessoal críticas a Araújo e a Olavo de Carvalho,
segundo sua versão. Em entrevista à revista Crusoé, o diplomata chamou Olavo de
“personagem nefasto para a política brasileira” e que Araújo “virou direitista
por oportunismo”.
Almeida, na mesma entrevista, disse que os militares estão
exercendo o papel diplomático na gestão Bolsonaro. Um episódio que materializou
o descrito pelo embaixador foi a ida do general Mourão à Colômbia para a
participação em debates sobre a situação da Venezuela. Mourão tomou
protagonismo na situação e ofuscou o trabalho do chanceler.
Focos de resistência
Apesar de sua relevância dentro do bolsonarismo, a
influência de Olavo de Carvalho entre o primeiro escalão e os aliados do
presidente encontra algumas barreiras.
Os “superministérios”, como foram apelidadas as pastas de
Economia, tocada por Paulo Guedes, e Justiça, cujo titular é Sergio Moro, têm
poucas digitais do filósofo. O que ocorre também nas pastas chefiadas por
militares, como Minas e Energia, Defesa e Infraestrutura.
Há ainda restrições a Olavo dentro da bancada do PSL na
Câmara dos Deputados. O líder do partido, Delegado Waldir (GO), disse em
entrevista recente à Gazeta do Povo que não conhecia Olavo e que “não dependia”
do filósofo para ser eleito. Na mesma linha, o também deputado federal
Alexandre Frota (PSL-SP) chamou Olavo de “eremita” e provocou: “não adianta, eu
não gosto do Olavo”.
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