O polêmico desfile da escola de samba da Gaviões da Fiel,
com a lamentável cena de um diabo atacando a pessoa representada por Jesus
Cristo, trouxe indignação, revolta e repúdio para a maioria da população
cristã.
As cenas dantescas representavam Satanás subjugando,
massacrando e humilhando Jesus, em uma luta descomunal, terminando com o diabo
cravando o tridente sobre o corpo de Cristo, arrastando-o pela pista do
sambódromo paulista.
Segundo o coreógrafo da escola, Edgar Junior, o foco era
chocar, mexer com a polêmica de Jesus e o diabo. Se este era o seu verdadeiro
intento, deve-se dizer que conseguira, porém de forma ilícita e desrespeitosa
com os cristãos mais fervorosos.
As pessoas estavam reunidas para ver desfiles de escola de
samba e não agressividades contra quaisquer tipos de fé, religião ou credo.
Acaso o coreógrafo quisesse trazer uma reflexão entre o bem
e o mal, com as escusas da arte, que o fizesse uma peça teatral, em recinto
restrito, onde os espectadores estariam cientes do tipo de espetáculo a que
iriam assistir.
As cenas levam à seguinte reflexão: até onde a arte aberta
ao público, com a cobertura de toda a imprensa, pode ser considerada sinônimo
da liberdade de expressão artística protegida pela Constituição Federal em seu
Artigo 5, inciso IX? O direito à liberdade de expressão é absoluto e
ilimitável? Permite-se uma exposição pública, em ambiente aberto a todo o tipo
de público, escondido por detrás do véu da manifestação artística?
Por óbvio não. Não existe direito absoluto e ilimitado. O
próprio direito à vida, bem maior, não é absoluto, estando previsto a exceção
XLVII do artigo 5, da CF/88, que, expressamente, diz: – “Não haverá pena de
morte, salvo em caso de guerra declarada”.
Não se defende a censura prévia da liberdade de expressão
ou da manifestação artística, que seria um retrocesso em nosso ordenamento
jurídico, mas defende-se que haja consequências para atos praticados de forma
abusiva e ilícita.
Apenas no campo das hipóteses, seria aceitável um desfile
de uma escola de samba, sob o véu da manifestação artística, que o coreógrafo
querendo demonstrar a discriminação contra homossexuais criasse cenas de
heterossexuais atacando, com pedras, porretes ou tridentes, a comunidade de
homossexuais, transexuais e afins?
Evidente que não. Da mesma sorte, não poder-se-ia aceitar
‘cenas artísticas’ que incentivasse o racismo ou fizesse apologia ao crime, é
curial.
O direito de se expressar, seja individual ou através de
manifestação artística, deve obedecer a todo o ordenamento jurídico, não
podendo o princípio da liberdade ser examinado de forma isolada e ilimitada. Se
assim não fosse, não teríamos condutas tipificadas como sendo calúnia, injúria,
crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia,
religião e etc.
A bancada evangélica do Congresso Nacional já se manifestou
que o ato praticado pela escola de samba não pode ser considerado arte, mas
crime, prometendo tomar as medidas cabíveis contra a Gaviões da Fiel.
O carnaval da Gaviões da Fiel não terminou. A escola deverá
desfilar, agora, nos corredores da Justiça, com o julgamento não de carnavalescos,
mas de um juiz togado.
Bady
Curi Neto, advogado fundador do Escritório Bady Curi Advocacia Empresarial,
ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG)
Fonte: Estadão
Comentários
Postar um comentário